O Fórum das ONG/Aids do Estado de São Paulo (FOAESP) realizou, nesta quinta (31/01) e sexta-feira (01/02) reunião para definir o Planejamento Estratégico das Ações para 2019.

Na quinta-feira, pela manhã, as associadas presentes contaram com a colaboração de Franklin Félix, da Associação Brasileira de ONG (ABONG), da professora Marília Louvison, da Associação Brasileira de Saúde Coletiva (ABRASCO) e de Eduardo Barbosa, do Grupo Pela Vidda/SP, que representou a diretoria do FOAESP, que apresentaram seus pontos de vista sobre a conjuntura política brasileira com a posse do novo governo federal.

Em sua apresentação, Franklin ressaltou que diversos dispositivos da Medida Provisória (MP) 870/2019 já foram pautados pelo Marco Regulatório das Organizações da Sociedade Civil (MROSC), uma vez que as organizações da sociedade civil podem elaborar meios de fiscalização interna. O representante da ABONG chamou a atenção para questões burocráticas, de documentação e de comprovação de gastos.

Segundo ele, a ABONG iria entrar com uma ação de inconstitucionalidade da MP, o que foi feito pelo Ministério Público Federal, que inclusive provocou a Procuradoria Geral da República a se manifestar.

Franklin referiu-se, também ao Decreto 9669/2019, que regulamenta o funcionamento do governo federal e alerta, mais uma vez, para a necessidade das organizações preservarem seus documentos rigorosamente em ordem. Além disso, ressaltou a importância de notas e posicionamentos serem traduzidos para o inglês e o espanhol para que a comunidade internacional possa ter contato com as denúncias sobre a realidade brasileira.

A professora Marília Louvison, da ABRASCO, fez um resgate histórico do SUS, nascido da Reforma Sanitária (anos 1970) e da Constituinte (1986-88), para afirmar que a invisibilidade leva à ruptura dos princípios do SUS e da Saúde Coletiva, referindo-se especificamente ao desmonte que o SUS vem sofrendo nos últimos anos. Segundo ela, a participação social deve ser reativada, fortalecida – referindo-se à criação do Programa brasileiro de Aids e da Comissão Nacional de IST, Aids e Hepatites Virais (CNAIDS), antes mesmo dos dispositivos constitucionais sobre a Saúde promulgados com a Constituição Federal de 1988.

Marília reforçou os cinco pontos da nota emitida em 24 de janeiro pela ABRASCO em conjunto à Associação Brasileira Interdisciplinar de Aids (ABIA), intitulada “Em Defesa da Política Nacional de HIV/AIDS”, a saber:

  1. “A manutenção do Departamento de Infecções Sexualmente Transmissíveis – IST HIV/AIDS e Hepatites Virais e dos recursos necessários para uma oferta de serviços de qualidade e de forma universal para toda a população brasileira, com estratégias específicas para as populações mais vulneráveis e que são afastadas dos serviços devido a uma onda crescente de violência, discriminação e exclusão.
  2. Garantia do direito ao tratamento e do direito à prevenção de todos os cidadãos e cidadãs, independentemente do tipo de família, orientação sexual, raça, gênero, religião, fase de vida, região onde habita ou situação econômica com a atenção, em especial, a todos e todas em condições de maior vulnerabilidade ao HIV/AIDS, incluindo prostitutas, pessoas transexuais, homens gays, populações em situação de rua, indivíduos privados de liberdade e usuários de drogas.
  3. Ênfase no combate ao estigma e à garantia dos direitos humanos das pessoas afetadas pelo HIV/AIDS e outras doenças infecciosas.
  4. Continuidade das campanhas educativas, dentro do marco dos direitos humanos e do respeito à diversidade sexual e social e, principalmente conectadas com seus públicos-alvo em linguagem e estética, com base nos princípios dos direitos humanos e fundamentadas em evidências científicas.
  5. Continuidade e ampliação de estratégias que investem em novas abordagens comprovadamente mais efetivas, como a prevenção combinada – que inclui o uso do preservativo e das Profilaxias Pré (PrEP) e Pós-Exposição (PEP) – e a constante atualização dos protocolos de tratamento, incorporando inovações que aumentam a eficácia do tratamento e a qualidade de vida das pessoas afetadas. O acesso universal às melhores ferramentas de prevenção e tratamento disponíveis deve ter como premissa o enfrentamento dos altos preços dos produtos por meio de estratégias consagradas de negociação e redução de preço, baseadas no uso das flexibilidades do Acordo TRIPS (em inglês, Agreement on Trade-Related Aspects of Intellectual Property Rights e em português, Acordo sobre Aspectos dos Direitos de Propriedade Intelectual Relacionados ao Comércio), tais como o licenciamento compulsório de patentes.”

Segundo a professora, o ativismo em HIV/Aids tem acúmulo suficiente para observar permanentemente as ações governamentais.

Eduardo Barbosa, do Grupo Pela Vidda/SP e da diretoria do FOAESP, que por nove anos esteve na diretoria-adjunta do Departamento de IST, Aids e Hepatites Virais do Ministério da Saúde, iniciou sua fala afirmando que o movimento de enfraquecimento da sociedade civil organizadas não é novo e nem é uma prática apenas da direita eleita e empossada. Para ele, o enfraquecimento provocado pelos governos são facilitados pela dificuldade de articulação das ONG/Aids. A divisão dos movimentos sociais envolvidos na resposta brasileira à epidemia também foi apontada como ingrediente facilitador do enfraquecimento do movimento de luta contra a Aids.

Segundo ele, é necessário que sejam diferenciadas, inclusive no marco legal, as organizações não governamentais das organizações sociais de saúde (as que estabelecem contratos de gestão com os governos para administrar equipamentos de saúde).

Ele reafirmou a importância da participação social em espaços como a CNAIDS, também ressaltando seu surgimento anterior à Constituição de 1988. Mas apontou o também enfraquecimento, no âmbito do Programa Brasileiro de Aids, dos programas de aids nos âmbito estadual e municipal.

As exposições foram seguidas de debate com representantes das ONG associadas ao FOAESP.

Hepatite C e HIV

Durante a tarde, Sirlene Caminada, coordenadora do Programa Estadual de Hepatites Virais (PEHV-SP) e Maria Clara Gianna, da coordenação do Programa Estadual de DST/AIDS (PE-DST/Aids-SP), ambos da Secretaria de Estado da Saúde de São Paulo, apresentaram o “estado da arte” destes programas.

Sirlene Caminada falou especificamente do tratamento da hepatite C no Estado de São Paulo, unidade federativa em que cerca de 8 mil pacientes esperam desde fevereiro de 2018 pelos medicamentos que compõem o tratamento da hepatite C no Brasil. A coordenadora do PEHV-SP detalhou as tratativas iniciadas no último dia 7 de janeiro pelo Ministério da Saúde, que disponibilizou ao Estado de São Paulo 2179 tratamentos no mês de janeiro, no qual um dos medicamentos tem validade até o dia 28 de fevereiro, cujo aceite pelo PEHV-SP foi sucedido por “uma operação de guerra” para que esses tratamentos estivessem na mão dos pacientes e fossem iniciados antes da última sexta-feira (25/01).

Segundo ela, entre dezembro de 2015 e dezembro de 2018 foram distribuídos no Estado de São Paulo 33.357 tratamentos para hepatite C, sendo 3936 tratamentos para pessoas com coinfecção HCV/HIV (11,8%).

Maria Clara Gianna iniciou sua exposição afirmando que a política de incentivo está mantida neste ano de 2019, mostrou os dados de detecção de HIV e Aids em São Paulo e no Brasil, bem como os de mortalidade e a razão de sexo entre as pessoas infectadas.

Uma das coordenadoras do PE-DST/Aids-SP, Maria Clara enfatizou a criação da QualiRede de cuidado contínuo às IST, ao HIV e às hepatites virais e elencou os 40 municípios do Estado nos quais a PrEP será expandida neste ano. Ela também apresentou a estratégia de distribuição do autoteste de HIV, que já está sendo distribuído pelo Estado de São Paulo e também deve ser expandida neste ano.

As exposições foram seguidas de debate. Confira abaixo os pontos do Planejamento das Ações do FOAESP para 2019:

Planejamento Estratégico 2019

As ONG associadas ao FOAESP definiram o Planejamento Estratégico de Ações para 2019, sem excluir temas e pautas emergenciais que se impuserem durante o ano:

- Aproximação com os movimentos sociais de defesa da Saúde Pública brasileira;

- Incidir mais fortemente sobre o subfinanciamento do Sistema Único de Saúde (SUS), visando reforço do financiamento da saúde;

- Reforçar a defesa do SUS e da política de Aids no Brasil;

- Manter ação pró-ativa em defesa do Departamento de IST, Aids e Hepatites Virais;

- Manter a documentação das ONG rigorosamente em ordem;

- Atuar para o fortalecimento dos programas municipais de DST/Aids no âmbito do Estado de São Paulo e dos programas estaduais, no âmbito nacional;

- Incidir sobre a mudança de componente dos tratamentos da hepatite C no âmbito do Ministério da Saúde, visando facilitar o acesso a estes medicamentos;

- Monitorar a aquisição e a distribuição, pelo Ministério da Saúde, dos insumos de prevenção às infecções sexualmente transmissíveis (IST) e do HIV/Aids;

- Monitorar a aquisição e a distribuição, pelo Ministério da Saúde, dos medicamentos para o tratamento do HIV;

- Reforçar a importância e manutenção das profilaxias pré e pós exposição (PrEP e PEP) sobre a estratégia da prevenção combinada ao HIV;

- Atuar mais incisivamente junto aos programas municipais e aos conselhos municipais de saúde, visando o fortalecimento da política de Aids no âmbito local;

- Participar do Fórum Norte/Noroeste de OG/ONG, visando seu fortalecimento;

- Acompanhar a tramitação da Medida Provisória 870/2019;

- Trabalhar pela aprovação do Projeto de Lei 1095/2017, no âmbito da Assembleia Legislativa do Estado de São Paulo, sobre Educação Sexual nas escolas;

- Trabalhar, nos âmbitos estadual e federal, para a recondução das frentes parlamentares de enfrentamento das IST, do HIV/Aids e das Hepatites Virais;

- Organizar um programa de educação continuada às associadas ao FOAESP, no intuito de promover uma capacitação permanente das representações das ONG.