A reunião de planejamento do Fórum de ONGs Aids de São Paulo (Foaesp) contou com esclarecimentos a respeito dos números que envolvem HIV/aids, hepatites virais e tuberculose no Brasil, principalmente no estado de São Paulo. Com a presença de representantes de entidades de diferentes regiões do estado, o objetivo é traçar metas a partir de esclarecimentos sobre dados fornecidos.

Números mais recentes do Sistema de Informação de Agravos de Notificação (Sinan), Sistema de Controle de Exames Laboratoriais da Rede Nacional de Contagem de Linfócitos CD4+/CD8+ e Carga Viral do HIV (Siscel) e Sistema de Informação sobre Mortalidade (SIM), mostram que até o dia, 30 de junho do ano passado, foram diagnosticados 15.653 novos casos de aids no Brasil. A média dos últimos cinco anos foi de 40 mil.

Maria Clara Gianna, coordenadora-adjunta do Programa Estadual de DST/Aids de São Paulo defendeu que já existem 400 usuários de PrEP, a Profilaxia pré-Exposição, cadastradas no Centro de Referência e Treinamento DST/Aids do estado, o CRT. “Precisamos entender que a PrEP é uma prioridade para o país e uma necessidade no estado de São Paulo. Se ela for bem utilizada, para algumas dessas populações vulneráveis, vamos ter um impacto importante”, disse ao explicar que a PEP e a PrEP são estratégias diferentes e que, se o usuário recorreu à PEP duas vezes em um mesmo ano, já é recomendada a indicação da PrEP

A enfermeira sanitarista, Ângela Tayra, conduziu a análise dos dados. Em São Paulo, do ano de 2006 a 2016, houve redução de 32,1% na taxa de detecção de doentes de aids. “Isso mostra que as pessoas estão fazendo diagnóstico, vão ser tratadas para ficarem com carga viral indetectável e também estão mais protegidas de doenças oportunistas. Podemos entender que, apesar das dificuldades, nosso sistema de saúde ainda funciona.”

No entanto, a taxa de infecções entre jovens de 20 a 24 anos no país é um fator preocupante. Em 2006, o índice de doentes por aids, nessa faixa etária, era de 16%. Já em 2016, o número duplicou e foi para 33,9%. “Com esses dados podemos entender que o diagnóstico é mais tardio e o acesso a esses jovens está difícil”, esclarece Ângela

Sobre a transmissão vertical, a taxa é menor que 2% no estado de São Paulo. Ainda assim, Ângela afirma que, para eliminar esse tipo de transmissão, é necessário um excelente pré-natal, acompanhamento durante a gravidez, e diagnóstico em mulheres.

Rodrigo Pinheiro, presidente do Foaesp destaca que “é um absurdo ter um caso que seja de transmissão vertical. É inamissível, porque isso representa uma grande falha no sistema”. Ângela completa explicando que há um protocolo de investigação de 40 páginas para acompanhar a mulher com HIV grávida, "por isso é importante ter detalhes, para detectar onde estão as falhas".

Apesar de, em São Paulo, as mortes por aids terem caído em 37,5%, a cada 100 novos casos no país, 19 são no estado. Em termos de patologia, a aids é o fator que mais mata homens de 25 a 34 anos no país. Perdendo apenas para agressões, acidentes de trânsito e suicídio. “Isso, é claro, sem considerar, que muitas mortes por suicídio acontecem com pessoas LGBT ou soropositivas”, aponta Ângela.

Rodrigo ressaltou a questão da desigualdade social como agravante na luta contra a epidemia. “Às vezes a pessoas têm outras necessidades que vão além da adesão ao tratamento. São outras prioridades sociais. Muitas vezes, ela está mais preocupada em conseguir comida, por exemplo. Algumas pessoas relatam que usam os 4 reais para comprar leite, não para pagar o transporte e chegar até o serviço de saúde”.

Cláudio Pereira, presidente do Grupo de Incentivo à Vida, rebateu afirmando que o transporte de ônibus dentro de São Paulo tem gratuidade garantida para a pessoa que vivem com HIV.

Hepatites Virais

“A nossa grande dificuldade é saber quantas pessoas efetivamente precisamos diagnosticar e tratar no estado. Hoje, o Ministério da Saúde gasta tanto em testagem, como em medicação para tratamento, o que compromete uma grande parte do orçamento, e ainda assim não é suficiente”, explica Sirlene Caminada, do Programa Estadual de Hepatites Virais.

O controle social da hepatite B e C tem sido enfatizado, principalmente por conta da implementação de medicamentos para a hepatite C. No entanto, Sirlene chamou atenção para o fato de que, ao contrário das outras doenças infecciosas, os óbitos por hepatite C têm aumentado.

Os números a nível mundial preocupam. Só em relação à hepatite B, são 2 milhões de casos no mundo e 240 milhões de portadores crônicos. “Isso significa que a gente ainda está muito longe da eliminação”, completa. No estado de São Paulo, há uma estabilização com tendência de queda. Mas é importante ressaltar que 9% dos casos são coinfecções com HIV/aids.

Segundo Sirlene, para a hepatite C é preciso falar de cura e insistir na testagem em pessoas com mais de 40 anos, principalmente aquelas que tiveram tratamento dentário, ou tomaram injeções nos anos 70 e 80.

De dezembro de 2015 a novembro de 2017 foram 24.591 casos de hepatite C em São Paulo. A meta da OMS visa a redução do número de infeções de 10 milhões para 1 milhão até o ano de 2030.

Sirlene critica a forma com que a medicação é obtida no Brasil. “Ampliar acesso é também tornar a dispensação de medicamentos simplificada. No entanto, no caso da hepatite C, é preciso solicitar o medicamento, que vem no nome do paciente. Devido a essa burocracia, os infectados esperam até seis meses para começarem combater a doença. Além disso, o tratamento no Brasil ainda é caro, cerca de 80 mil reais por mês”.

Sobre a hepatite A, Rodrigo explica que a vacina é nova e precisa ser mais divulgada. “Hoje, a principal forma de transmissão é através do contato com a região anal. Ou seja, quem faz uso da PrEP ou PEP, também tem que se vacinar, porque são pessoas que sabem que estão expostas ao risco.”, finaliza Sirlene.

Turbeculose

O Brasil tem mais de um terço do número de casos de tuberculose do mundo. São 183 novos diagnósticos por dia. Como resultado, 5 mil mortes por ano só no país. Em proporção, o estado de São Paulo lidera o número de casos, um total de 22 mil infecções, segundo Boletim Epidemiológico do ano de 2017. Desse total, 9,1% são coinfecções com HIV.

Diante desse cenário, Vera Galesi enfatizou que os soropositivos precisam fazer o teste para tuberculose todo ano, caso o resultado seja negativo. Paulo Giacomini, integrante do Foaesp, rebateu afirmando que alguns médicos dizem não haver necessidade e, por isso, não recomendam que os pacientes com HIV façam o teste. No entanto, Vera reforça que a vacina BCG não é eficaz para adultos, mas sim para crianças menores de 15 anos. "Há estudos buscando vacinação eficaz contra tuberculose em adultos e, enquanto isso, a testagem deve ser priorizada."

Vera esclareceu que somente pessoas que estão doentes podem transmitir o vírus, já que é possível estar infectado, mas não doente de tuberculose. A disseminação acontece por tosse. Se não tratado, o paciente pode transmitir a doença para até 15 pessoas. Crianças não transmitem a infecção, ainda que pela tosse, pois os bacilos ficam fechados nos alvéolos, diferente dos adultos, que expelem o vírus em forma de defesa. Quem está em tratamento adequado, também não representa risco.

“Independente da idade, todas as pessoas diagnosticadas com tuberculose precisam fazer testes de HIV. Da mesa forma que uma pessoa vivendo com HIV que apresenta tosse, febre, perda de peso ou suores noturnos deve fazer o teste para tuberculose o quanto antes”, enfatiza Vera. A meta da OMS é reduzir o número atual para 10 casos a cada 100 mil habitantes até o ano de 2035 e o número de óbitos para 1 a cada 100 mil habitantes. “Lembrando que quanto menor o número de óbitos, maior o desafio”, finaliza Vera.