Rodrigo Pinheiro*

Neste fim de 2024 e logo após mais um 1º de dezembro, Dia Mundial de Luta Contra a Aids, o que nós, ativistas, percebemos é que a luta é pautada por avanços e inúmeros desafios para as pessoas que vivem com HIV/aids no Brasil. Podemos comemorar, mas jamais esquecer, que nossa luta é diária e constante. E é isso que nos move.
Se nossa meta é a eliminação do HIV enquanto problema de saúde pública, comemorar o 95-95-95 nos impõe reflexões. A meta, estabelecida pela Organização Mundial da Saúde (OMS), tem como objetivo que 95% das pessoas que vivem com HIV conheçam seu diagnóstico; que 95% das pessoas que vivem com HIV estejam em tratamento antirretroviral; e que 95% das pessoas em tratamento estejam com a carga viral suprimida.
Enquanto temos avanços no diagnóstico, na possibilidade da pessoa conhecer sua sorologia, e na condição da carga viral suprimida para as pessoas que aderem ao tratamento, o 95 “do meio”, da retenção das pessoas para fazer o tratamento, é o ponto que mais gera preocupação. Em um país que tem o Sistema Único de Saúde (SUS), que disponibiliza tratamento gratuito para as PVHA, o não avanço nesse aspecto é um desafio. Ainda temos dificuldades na vinculação das pessoas ao tratamento e, consequentemente, não temos aumento no número de pessoas que vivem com HIV/aids que se tratam. E essas dificuldades têm causas nos aspectos sociais, que impactam na adesão.
Por mais que tenhamos políticas para isso, como o Programa Brasil Saudável, criado neste ano como desdobramento do Comitê Interministerial para a Eliminação da Tuberculose e de Outras Doenças Determinadas Socialmente, de 2023, para a eliminação de doenças determinadas socialmente, ainda não conseguimos impactar nessa meta do tratamento, do 95 “do meio”, e este é um desafio importante.
Consideramos que a proposta do Brasil Saudável é de suma importância para podermos fazer o enfrentamento das doenças determinadas socialmente, e são mais de dez patologias invisibilizadas. Entretanto, é necessário que a Secretaria Geral da Presidência da República assuma a responsabilidade no papel de protagonista da articulação interministerial para a busca de recursos, e o Departamento de Departamento de HIV/AIDS, Tuberculose, Hepatites Virais e Infecções Sexualmente Transmissíveis do Ministério da Saúde (Dathi/MS) cuide das patologias sob seu guarda-chuva. 
Também importante é a reflexão que precisamos fazer sobre a comemoração da eliminação da transmissão vertical em muitos municípios. Considero uma obrigação, diante de tantas tecnologias disponíveis para este fim. Entretanto, o Foaesp e o Programa Estadual de IST/HIV/aids da Secretaria de Estado da Saúde de São Paulo vêm alertando o Dathi/MS sobre a recorrente falta de medicamentos antirretrovirais em maternidades do estado para impedir que bebês nasçam infectados.
Outra questão esquecida e preocupante é prevenção e o cuidado com a mpox. Mais de 90% dos óbitos por essa doença são de PVHA, e é necessário e urgente que o governo disponibilize as vacinas para essa população se proteger.
O Brasil está atrasado na incorporação dos medicamentos de longa duração para prevenção e tratamento. Há países que já incorporaram e outros estão em proposições avançadas sobre o tema. Precisamos discutir internamente e viabilizar a incorporação, para garantir o acesso e o bem-estar de nossa população. Além disso, é necessário pensar sobre licenciamento compulsório, no caso dos medicamentos com preços abusivos.
Resultado de toda nossa luta e da articulação entre os movimentos sociais, a Frente Parlamentar Mista de Enfrentamento às ISTs, HIV/aids e Hepatites Virais, e a Secretaria de Relações Institucionais da Presidência da República, o incremento para o orçamento de 2025 nas ações de enfrentamento é um ponto positivo a ser comemorado. O incremento, que não aconteceu nos anos anteriores, é fruto de pressão junto aos órgãos competentes, e o trabalho continua ainda neste fim de ano, para que a proposta não seja modificada dentro do Congresso Nacional. Também comemoramos a aprovação na Comissão de Saúde de emenda orçamentária para fortalecimento dos serviços especializados em HIV/aids e na elaboração de projetos de ações da sociedade civil. A articulação intersetorial é fundamental para que haja mais recursos no enfrentamento às ISTs, HIV/aids e hepatites virais.
Estas são algumas reflexões sobre temas importantes para que possamos avançar na resposta ao enfrentamento às ISTs, HIV/aids e hepatites virais. Por mais que tenhamos pontos a comemorar, não podemos nos esquecer de nossa luta para garantia dos direitos das PVHA e da saúde como direito em nosso país. Estamos aqui, sempre. Um bom 2025 para todos!

*Rodrigo Pinheiro é presidente do Fórum das Ong/aids do estado de São Paulo (Foaesp)