Rodrigo Pinheiro (*)
A taxação das grandes fortunas, apesar de estar no texto constitucional, desde 1988, não foi ainda regulamentada. Isto revela o imenso poder de influência da classe mais rica do nosso país e o temor dos parlamentares de tocarem em um tema que resultaria em mais justiça social e qualidade de vida.
Recente pesquisa do IBGE mostrou que, em 2018, o rendimento médio mensal de trabalho da população 1% mais rica foi quase 34 vezes maior que da metade mais pobre. Enquanto a parcela de maior renda arrecadou R$ 27.744 por mês, em média, os 50% menos favorecidos ganharam R$ 820. A concentração de renda é um problema que se arrasta desde o descobrimento e que não teve a iniciativa dos governos e parlamentos em sua implementação. A esperança de que a Constituição Federal pudesse reverter este quadro foi se desmanchando ao longo do tempo. No entanto, no plano internacional, em recentes manifestações, que sacodem países por todo o mundo, o tema ressurge não apenas como forma de minimizar a distância entre ricos e pobres, mas como alternativa de financiamento de áreas essenciais como a saúde e a educação.
Há algum tempo a campanha pela criação de um imposto sobre transações financeiras (FTT) - também conhecido como Robin Hood Tax -, mobilizou ativistas de diversos países. Partindo do princípio de que há um setor social privilegiado nos sistemas tributários em vigor em todo planeta, uma aristocracia financeira composta por bancos, instituições para-bancárias e super-ricos que especulam com títulos do Estado, exigiam que este privilégio fosse transformado. A Campanha propunha taxar em 0,05% o mercado de derivativos — o que, estima-se, geraria cerca de US$ 68 bilhões por ano, a serem revertidos aos fundos das Nações Unidas (de combate à fome, doenças). Esses recursos são considerados necessários para a implantação das metas de desenvolvimento pós-2015, quando entram em vigor os ODS (Objetivos de Desenvolvimento Sustentável), substituindo os ODM (Objetivos de Desenvolvimento do Milênio).
É chegado o momento do tema voltar ao debate. Diante dos recursos limitados do Estado, da priorização para outras áreas que não o social, do recrudescimento de epidemias, sobretudo ligadas às populações mais vulneráveis e à pobreza, novas fontes de recursos precisam ser estabelecidas. É a hora dos que ganharam muito repartir seu lucro com os que alicerçaram este alcance e que hoje, abandonados pelo braço estatal e indiferentes aos mercados, sofrem agruras de todos os tipos.
Esperamos que o Congresso brasileiro veja as necessidades da população e que implemente esta legislação. As manifestações que ganham as ruas no mundo todo exigem a construção de uma sociedade mais justa e de governos mais sintonizados com as necessidades de seu povo. A semente da mudança está sendo germinada e seu florescer virá em forma de diálogo construtivo ou de forma mais contundente de se fazer valer, a escolha agora cabe aos que têm o poder de decisão.
(*) Presidente do Foaesp