“Perdi a vontade de viver com tanta exposição. Hoje, sinto que não sou a mesma pessoa de antes. Senti um distanciamento de quem estava à minha volta e, às vezes, me sinto até perseguida. Saía de casa e via que as pessoas estavam falando de mim". Fernanda desabafou assim ao site Universa em março, após ter laudos de saúde expostos por profissionais de saúde e decidir processar o município de São Paulo. Fernanda é uma pessoa que vive com HIV/aids.

Em janeiro, a lei que torna obrigatória a preservação do sigilo sorológico das pessoas que vivem com HIV/aids, hanseníase, tuberculose e hepatites virais (Lei 14.289/22) foi aprovada. A lei é uma grande conquista, depois de muita luta dos movimentos sociais.

A lei, que garante o sigilo e evita a exposição da sorologia, evitando prejuízos em situações de trabalho e em atendimentos em unidades de saúde, por exemplo, é determinante na luta contra o estigma, o preconceito e a discriminação.

Fernanda só havia revelado seu diagnóstico para a mãe, justamente por temer consequências em sua vida pessoal e profissional, por medo de sofrer preconceito, estigma e discriminação.

A exposição dos laudos de saúde dela aconteceu em 2020, e só dois anos depois ela entrou com a ação contra o município, que gerencia a unidade de saúde onde ela realiza o tratamento e foi a responsável pelo vazamento dos dados.

"Desde o início procurei apoio jurídico porque sabia dos meus direitos, mas só agora tive coragem de revisitar toda a história porque tudo isso me magoa e mexe muito comigo. Tive um abalo psicológico forte, isso tudo me causava muito transtorno e brigas familiares”, revelou Fernanda ao Universa.

Em setembro do ano passado, o Tribunal Regional Federal da 3ª Região condenou a União a pagar indenização a Antônio, soldado do Exército que vive com HIV/aids e que teve a condição exposta em um boletim. Ele foi, também, expulso da corporação.

De acordo com o site Consultor Jurídico, o soldado sofreu discriminação por parte de seus colegas militares e de familiares deles. Após a divulgação do boletim com a exposição dos dados médicos do soldado, que aconteceu na cidade de Guarujá (SP) em 2019, Antônio disse que se sentia “um lixo”.

A lei 14.289/22 tem importante papel na luta das pessoas com essas patologias contra o preconceito, o estigma e a discriminação. De acordo com o texto, os agentes públicos e privados ficam proibidos de divulgar ou compartilhar informações que permitam identificar a condição dos pacientes. A proibição é para serviços de saúde, estabelecimentos de ensino, locais de trabalho, administração pública, segurança pública, processos judiciais e mídia escrita e audiovisual.

“A garantia ao sigilo é um direito civilizatório, humanitário e há muito tempo o movimento nacional de luta contra a aids desejava por esta aprovação”, comemorou o senador Ranfolfe Rodrigues, autor do projeto da lei, durante a aprovação no Senado Federal, em dezembro passado.