Várias medidas autoritárias contra a saúde global, em especial dos mais vulneráveis dentro e fora das fronteiras dos Estados Unidos, foram recentemente impostas pelo atual governo Trump, como a retirada da OMS, o fechamento de programas de prevenção e tratamento do HIV/AIDS e a redução drástica de pessoal na Agência dos Estados Unidos para o Desenvolvimento Internacional (USAID) com a possibilidade de fechamento total. Essas decisões colocam em risco programas essenciais de assistência à saúde e ajuda humanitária, como o Plano de Emergência da Presidência dos Estados Unidos para o Combate à AIDS (PEPFAR) que foi criado em 2003. O PEPFAR, como outros programas assistências americanas, está suspenso por pelo menos 90 dias.

Nesta nota, queremos alertar a população e informar com urgência a sociedade civil brasileira sobre os impactos que essas medidas profundamente desumanas têm sobre as pessoas vulnerabilizadas no nosso sistema de saúde.

Desde 2015, o PEPFAR apoia o projeto A Hora é Agora, que atualmente é implementado em 5 grandes capitais brasileiras. Iniciado em Curitiba, o projeto ao longo dos últimos anos se estendeu as cidades de Porto Alegre, Florianópolis, Campo Grande e mais recentemente Fortaleza. Desde então vem atendendo milhares de pessoas, especialmente HSH e população trans, para realização de testagem/diagnóstico, vinculação ao tratamento, disponibilização de PREP e PEP,além de estratégias de adesão ao TARV, como a entrega domiciliar de medicação, sempre se destacando pelos aspectos de indução e inovação na resposta a AIDS no Brasil, sendo inclusive apoiadora de projetos estratégicos para a implementação de novas tecnologias de saúde.
 
O PEPFAR, assim como em outros países do mundo, também está interrompido no Brasil após as decisões do Presidente Donald Trump.

Diante disto precisamos analisar o impacto destas medidas na resposta local ao HIV/Aids bem como estratégias mitigação factíveis. Atualmente, o projeto mantinha 21 centros de testagem (CTA), 16 serviços especializados e ações de apoio para atenção primária. A suspensão destes serviços terá desdobramentos importantes na rede de saúde, comprometendo metas de eliminação do HIV/Aids enquanto problema de saúde pública, a ampliação da PrEP e PEP e do diagnóstico precoce. Além de desdobramentos em indicadores relacionados à sífilis, ações de prevenção combinada e coinfecção TB/HIV. Na última semana, foi anunciada a suspensão dos serviços na cidade de Porto Alegre por tempo indeterminado.

Em Fortaleza, a gestão municipal anunciou que está construindo estratégias para incorporarem os serviços e suas equipes na rede de saúde. Contudo, precisamos de um diagnóstico mais preciso em relação à situação nas demais capitais e das ações propostas pelos três entes federativos - federal, estadual e municipal - para garantir a continuidade destes serviços de referência.

Neste cenário de dúvidas, nos parece pertinente questionarmos qual o posicionamento das prefeituras locais, dos governos estaduais e do Ministério da Saúde? Haverá estratégias e/ou ações para suprir as lacunas deixadas pela interrupção do Projeto A Hora é Agora? Segundo a Secretaria de Saúde de Porto Alegre, esse projeto ainda não tem previsão de retomada. Nesse caso, como ficará a população beneficiada e os profissionais que trabalham no projeto? Como pensar na incorporação efetiva dos usuários destes serviços em uma rede de atenção primária fragilizada por desmontes, terceirizações e desfinanciamentos paulatinos? Como está a situação dos serviços e usuários em Curitiba e Campo Grande?

É urgente o pronunciamento do Ministério da Saúde sobre esta questão bem como a apresentação de propostas que possam subsidiar técnica, política e programaticamente as capitais atingidas diretamente na construção de ações de mitigação.
 
Ainda, manifestamos nossa preocupação com a repercussão destas ações na agenda de direitos humanos, especialmente no que se refere às questões relacionadas a direitos sexuais e reprodutivos, identidade de gênero , população LGBTQIAPN+ e a agenda antirracista

Reafirmamos que seguiremos vigilantes e atuantes na defesa da saúde como um direito humano inegociável e no compromisso com o enfrentamento do machismo, da LGBTQIAPN+fobia, do racismo e das iniquidades sociais.


Associação Brasileira Interdisciplinar de AIDS - ABIA Grupo de Trabalho sobre Propriedade Intelectual – GTPI Articulação Nacional de Luta contra a AIDS - ANAIDS